quinta-feira, 29 de junho de 2017

Conta-me Hi(E)stórias #3

Ele prometeu-lhe o mundo. Ela acreditou. No auge da sua ingenuidade, confiou.
Ele prometeu-lhe beijos, abraços, justiça, paciência, igualdade, respeito, amor incondicional. Ela acreditou. Movida pela sua paixão, confiou.
Ele prometeu afagar-lhe o cabelo, enxugar-lhe as lágrimas, lembrar datas especiais, roubar uma flor num qualquer jardim, levá-la ao colo, fazê-la sentir todos os dias especial. A mais especial. Acima de tudo. E agradecer-lhe, mais com gestos, do que com palavras, por tudo. Ela acreditou. E, no pico da sua jovialidade, confiou.
Ele prometeu nunca a deixar cair. Ou, se por algum motivo, não conseguisse, ajudá-la-ia a levantar-se. Sem perguntar, sem julgar, sem censurar. Só entendendo. Porque haviam circunstâncias na vida inevitáveis, mas isso não deixara de a magoar. Percebera desde sempre que ela era diferente. Tinha uma imensa fragilidade emocional. Faltara-lhe um suporte que ela nunca havia conseguido solidificar. Mas ele até gostava disso. Porque essa debilidade conferia-lhe uma delicadeza, um cuidado, uma preocupação fora do comum. E ele tratava-a nas 'palminhas das mãos', com o cuidado que ela precisava. E prometeu-lhe que seria sempre assim. Ela acreditou. Instigada pela sua vulnerabilidade, confiou.

[...]

A meninice passou. A ingenuidade passou. Os sonhos deram lugar a uma realidade crua. Ao perceber a injustiça e crueldade da vida, o altruismo deu lugar a um egoísmo que lhe corrói a alma. Ela está diferente. Talvez nem se reconheça a ela própria. Mas foi assim que lhe disseram para ser. Roubaram-lhe a inocência. No dia em que lhe roubaram a justiça, a igualdade, os cafunés, as flores, as mensagens, o colo, a paciência, a compreensão. No dia em que o mundo, de um dos lados (o dela) continuava igual: sem um suporte emocional. E, pior do que isso, sem sonhos, nem crenças em promessas. Sem a esperança de que ele colmatasse essa falha. 
A compreensão dava lugar à falta de empatia. A carência que outrora lhe suscitava preocupação e um carinho redobrado, dava agora azo a incompreensão. Ele não percebia. Achava que ela tinha tudo. 
A diferença é que ele, de facto, tinha mais do que alguma vez desejara. Ela tinha muito menos do que sonhara. E o problema talvez fossem as expetativas. Ela precisava que ele fosse o que prometera! E ele perdera a sensibilidade emocional que antes a apaixonara!

[...]

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