terça-feira, 22 de novembro de 2016

Mãe:

[A ti, mãe. A mim, mãe. À minha filha, se algum dia for mãe. A todas as mães...]

Estes dias li nas redes sociais um texto maravilhoso que dizia, entre outras coisas: "Mãe, desculpa tudo aquilo que nunca te disse. (...) Não quero ser fraca, nem quero chorar, mas se pudesse tornava-te imortal!" 
Fez-me pensar no que nunca te disse... e tu pensas que eu não sei/sinto...

Há uns anos, tinha eu 17, saía de casa para vir estudar para Braga. Nunca tinha saído da terriola para lado nenhum. Nem tu. Tinhas medo. Por ti e por mim. Não sabias como me ajudar, mas fizeste das tripas coração para arranjar contactos que me fizessem ter uma casa para morar, quando cá chegasse. Mas continuas a dizer que fui eu que me desenrasquei sozinha. Nunca o conseguiria sem ti. No dia em que vim, foste parar ao hospital. Nunca mo disseste, soube há muito pouco tempo. O teu sistema nervoso (que disfarças sempre brilhantemente) não te permitia respirar sem auxílio. Mas a tua voz firme, dizia sempre: "Vai, sem medo, que vai ser o melhor para ti. Vai correr tudo bem!" Mesmo que isso implicasse ficar 5 dias por semana sem mim.

Nunca saíste de Portugal e tens sonhos do tamanho do Mundo. Nunca te levei a viajar e nunca passei férias contigo. Perdoas-me sempre isso e nunca me cobras a presença.

Já tu, lembro-me como se fosse hoje, das vezes que íamos à feira juntas e eu (com uns 10 pares de calças no armário) pedinchava mais umas. Davas-me sempre que podias. Com os troquinhos que juntavas dos trabalhos extras que fazias. E às vezes lá me dizias com o olhar mais triste do mundo: "Oh Patrícia, faltam 5€. Se quiseres, vais ter de pôr do teu..." E deixavas de comprar o que te fazia falta. Ias ao talho e compravas fêveras para ti e um bife do vazio para mim. Dizias sempre que não tinhas fome, só para eu comer mais um bocadinho. 

Faço um esforço enorme, recuo no tempo, mas não me consigo lembrar de uma única vez em que te vi doente. Se algum dia estiveste, nunca te queixaste. Fizeste sempre o almoço, o jantar, os lanches, arrumaste sempre a casa. E, quando trabalhavas ao fim-de-semana, ainda deixavas a comida já feita, para ser só aquecer. Quando eu estava doente, fazias-me chá, cobrias-me, perguntavas-me de 5 em 5m como estava e se queria que fosses comigo ao médico. Seguravas a minha cabeça enquanto eu vomitava e davas-me religiosamente a medicação à hora certa, quando era necessário. 

Desde esse dia, há quase 15 anos atrás, nunca mais voltei para o ninho. E tu nunca te importaste. Nunca te queixaste. E como a vida, às vezes, dá fardos demasiado pesados aos mesmos, a vida levou também o teu filho (e toda a gente sabe que os homens são sempre os meninos das mamãs. E eu sei a relação especial que vocês têm) para outro país. Longe. Mas disseste-lhe sempre: "Vai. Vai correr bem. Vai ser o melhor para ti." Vi-te chorar na porta de embarque e eu tive de ser forte e secar internamente as lágrimas antes de as deixar cair. Naquele momento eras mais pequenina do que eu. Estavas a chorar nos dias seguintes, quando eu te ligava, mas a tua voz pronunciava sentimentos contraditórios: "Eu estou bem. Não te preocupes. Tens a tua vida, que é mais importante do que a minha. Vocês têm a vossa vida e eu estou feliz por vos ver encaminhados".

De repente, tens-me a mim, à tua neta e ao meu irmão longe de ti todos os dias. Não são 10m de caminho, em que possas ter o prazer de vir passear comigo quando te apetece, de ir buscar a tua neta à creche ou dar um abraço ao teu filho que é um menino tão especial.
E nunca nos cobras isso. Contentas-te com um telefonema, uma chamada de skype, um almoço de Domingo, de 15 em 15 dias, um sorriso da tua neta. E falas de mim com um orgulho inexplicável. Só de escrever isto já sinto os teus olhos a brilhar.
És despitada, falas alto, não tens muita opinião própria, deixas-te ir pelas ideias dos outros, tomas atitudes com as quais nem sempre concordo. Mas, mãe, tomara eu ter uma terça parte do teu altruísmo. És tão especial. Tão nova (conheço poucos amigos que tenham uma mãe com 53 anos). Tão bonita. Consegues, no meio do caos, ver sempre 'o copo meio-cheio'. E eu nunca te disse isto. Talvez porque nunca tinha sido mãe antes. E não sabia, ainda, que precisávamos de ouvir isto.

E sabes, mãe, tudo isto que fazes por mim já valeu a pena, porque (sem falsa modéstia) fez de mim a melhor mãe do mundo para a minha filha. E quero orgulhar-te tanto por isso...
Nunca to disse, mas tenho-te todos os dias na cabeça e no coração. Tu és a prova de que, quanto menos se tem, menos se precisa. Um dia destes, prometo que te levo a andar de avião. Vamos dar um abraço ao teu menino!

Sabes, mãe, 'se eu pudesse, tornava-te imortal'!



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