sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Conta-me Hi(E)stórias #5

💗
Um dia, sentaram-se, no sofá, lado a lado e não tinham assunto.
[Foi só um dia de trabalho cansativo em que estamos exaustos].
No dia seguinte, em que mal se viram, ela deitou-se e adormeceu. Ele ficou em silêncio, noutra divisão, a fazer zapping na TV e a rever, pela enésima vez, as novidades das redes sociais.
[Oh, é só uma fase menos boa, com preocupações acrescidas e decisões importantes a tomar].

E assim se passaram anos, volvidos nestas desculpas e justificações. Perdidos na correria do dia-a-dia e no vazio do silêncio que ficava quando os filhos dormiam. Os filhos... que eram, agora, a única fonte de vida. Como se, enquanto casal, tivessem deixado de existir. Como se fosse tudo dado como adquirido. Como se não houvesse necessidade de contrariar o que acabaria por ser inevitável. Como se tivessem de se conformar, porque 'acontece a todos'! 

Não, não acontece. Só a quem permite. A quem não se importa. A quem não quer. Porque quando não se quer, arranjam-se desculpas; quando se quer muito, arranja-se maneira!

Durante muito tempo, a velha frase 'ah e tal que um filho muda tudo' ecoava, vinda de bocas distintas. Efetivamente, fazia-lhe alguma confusão a percentagem de divórcios depois dos filhos. Mas, a verdade é que isso só acontecia aos outros! Não perceberam, portanto, o malabarismo inerente à árdua tarefa de fazer um relacionamento saudável sobreviver à reviravolta que as suas vidas levaria.

As mudanças bruscas de rotinas, a falta de tempo, o cansaço, as hormonas, os silêncios em que cada um mergulhou, a falta de diálogo, as discórdias, a falta de paciência... estavam a começar a deixar marcas irreversíveis. Das mãos dadas, dos sorrisos fáceis e apaixonados, dos jantares a dois, das férias... havia só memória. Quando eram necessários planos. Que ficavam sempre para segundo plano!
Os anos foram passando e eles tinham-se esquecido do caminho que tinham percorrido até ali. Das técnicas de conquista, das maluquices feitas no auge de uma paixão arrebatadora, dos elogios, dos afetos... isentos de um papel de 'pai' e 'mãe'. Eram dois estranhos, agora. Emboídos em ataques, críticas, comparações, queixumes. 

Um dia, resolveram refletir sobre esta estranhesa que se havia instaurado nesta relação. Perceberam que:
- há muito que não se elogiavam mutuamente. Havia críticas permanentes, causadas sobretudo por discórdias relativas à forma de educar os filhos. Pela falta de trabalho em equipa. Pela falta de espírito de sacrifício para as alterações que são precisas fazer. 
- falta de diálogo. As reações eram 'a quente'. Em vez de falar e trocar opiniões, discutiam. Mediam forças, para ver quem 'levava a taça'. Apontavam dedos.
- Ciúme. Ele, por não saber lidar muito bem com esta nova versão da sua esposa enquanto mãe e porque, nos primeiros tempos, esta tinha, quase inevitavelmente, uma relação muito mais próxima com os filhos e ele ficara sem saber qual a sua posição. Ela, porque sentia que precisava, mais que nunca, de ser elogiada, valorizada e considerada a melhor mãe do mundo. O orgulho que os homens têm pelas mães e que o demonstram, tem de ser canalisado também para a esposa, sobretudo depois desta ser mãe.
- Falta de tempo. Para cada um individualmente e para os dois. A mulher é, infelizmente, muito mais penalizada a este nível, no que respeita ao tempo para si mesma. E é normal que sinta muito mais necessidade de sair das rotinas do dia-a-dia. Ele nunca refletira sobre isso. E, enquanto casal, perderam-se. Deixaram de atribuir importância aos desejos um do outro. O mau-humor, gerado muitas vezes por noites mal dormidas, acabava inevitavelmente em discussões. Esqueceram-se de cuidar emocionalmente um do outro. 

Tudo junto, gerara uma série de conflitos interiores que criaram uma barreira que os impedia de olhar da mesma maneira um para o outro. É difícil engolir sapos, ignorar o orgulho, relativizar reações. Sobretudo se for unilateral. Esqueceram-se que quem ama, cuida. Quem gosta, fica. Quem quer, luta. Quem se importa, demonstra. E percebe quando o outro não está feliz.

No dia seguinte, voltaram a sentar-se no sofá, lado a lado, olharam-se e questionaram: 'Ainda me amas?'
Não respondam. Mostrem. Provem. As palavras não são suficientes. 💗

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